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5. JOSÉ E MARIA, UM HOMEM E UMA MULHER

A Sagrada Família chega a Nazaré depois de ter escapado à violência de Herodes e depois de um período de exílio num país estrangeiro. As guerras e as migrações não acontecem apenas hoje. Cada época tem os seus dramas e contradições, e cada família, hoje como ontem, é afetada por eles. José e Maria também viveram a sua paternidade e a maternidade não sem dificuldades. Vamos mais uma vez a Nazaré para contemplar à luz evangélica a verdade do homem e da mulher segundo a vontade eterna de Deus e os acontecimentos dos tempos.


A revolução sexual na narração moderna

E de fato não é difícil reconhecer como as duas maiores tragédias do nosso tempo são o aborto e a morte do pai, o massacre físico das crianças e o massacre cultural dos pais. À mortificação do destino materno da mulher e do destino paterno do homem soma-se hoje a tentativa de nivelar, desvalorizar ou mesmo cancelar a diferença natural dos sexos: ser homem ou mulher não seria mais um fato objetivo, mas uma preferência subjetiva. Tudo isto em franca contradição com o bom senso de todos os tempos e com as aquisições científicas de hoje: não há dúvida de que o que uma criança necessita é de uma família, de um pai e de uma mãe claramente distintos na sua posição sexual e claramente unidos no seu amor conjugal.


Quem acompanha o percurso educativo, psicológico e espiritual dos jovens percebe isso muito bem: a confusão dos papéis familiares e das identidades sexuais, ou seja, a perda do que realmente é ser um pai e uma mãe, e o obscurecimento do que são o dom e a tarefa específicos do homem e da mulher, compromete seriamente o amadurecimento afetivo dos meninos e das meninas, não sem desorientação dos próprios adultos. Assim, o afeto tem falta de respeito, o diálogo se transforma em conflito, o sentimento acaba em ressentimento e a intimidade dá lugar ao estranhamento. Eis o fruto da revolução sexual: não uma verdadeira libertação, mas a incapacidade dos homens e das mulheres de compreenderem o que um homem e uma mulher querem e precisam. Como observou Elizabeth Badinter, fazendo uma cuidadosa revisão da história do feminismo, as mudanças induzidas pelos protestos dos anos sessenta e pela revolução sexual: “destruíram em pouco tempo cinco mil anos de distinção dos papéis e dos universos”. Na realidade, diz o Papa Francisco com carinho numa das suas belas catequeses sobre a família, “para resolver os seus problemas de relacionamento, o homem e a mulher devem antes conversar mais, ouvir-se mais, conhecer-se mais, amar-se mais”.


A educação sexual na história bíblica

Basta parar um pouco em Nazaré para redescobrir a gramática dos sexos, necessária para a expressão do amor. A narrativa bíblica, que apresenta a história da salvação como uma sucessão de gerações, tem sempre o cuidado de realçar a diferença entre homem-mulher. Nem precisa ter grande destaque, porque é a coisa mais natural e mais sagrada do mundo: é a diferença que nos faz existir e nos torna imagem e semelhança de Deus!



Entretanto, um dos fatos mais surpreendentes da história sagrada em comparação com as narrativas de outras religiões é que Deus se revela definitivamente no espaço de uma família. Nela, o Filho de Deus torna-se homem como um menino, não como um andrógino, e Maria é apresentada como a esposa virgem de José, homem da casa de Davi. É notável que Maria seja saudada como a “cheia de graça”, enquanto José é chamado “filho de Davi”: ela vive uma gravidez divina, ele assegura uma descendência histórica. A linguagem é realmente diferente: José é pressuposto nas palavras proféticas dirigidas por Natã ao Rei Davi: “eu suscitarei depois de ti a tua posteridade, aquele que sairá de tuas entranhas e firmarei o seu reino. Ele me construirá um templo e firmarei para sempre o seu trono real (2Sam 7,11-13). E é o anjo Gabriel quem fala com Maria em nome de Deus: “Não temas, Maria, pois encontraste graça diante de Deus. Eis que conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus” (Lc 1,30-31). Como podemos ver, Maria colabora com Deus na ordem de gerar, José na ordem da descendência. Maria, como toda mulher enquanto tal, é ternura, e José, como todo homem enquanto tal, oferece estabilidade. Em última análise, Deus valoriza através da sua própria revelação aquele dado da realidade que se vive na família: que a mulher é, ela própria, a casa do homem, enquanto o homem constrói a ela, uma casa. A orientação materna da mulher é, em última análise, um símbolo direto da misericórdia de Deus (em hebraico, “misericórdia” indica literalmente as “entranhas maternas”!), enquanto o destino paterno do homem representa melhor a justiça de Deus. Misericórdia e justiça que em Deus são uma coisa só, porque Deus exerce a sua justiça exatamente na ótica e em termos de misericórdia. Diante do conjunto de justiça e misericórdia de Deus, se compreende, por analogia, a comum fecundidade do homem e da mulher: o homem não é fecundo sem a mulher e nem a mulher é fecunda sem o homem, nem o homem sem se doar todo a ela, nem ela sem o acolher totalmente.


Como escreveu o Cardeal Ratzinger na bela carta sobre a colaboração do homem e da mulher na Igreja, a mulher é chamada a acolher, o homem a transmitir. Ou, como disse um bom teólogo como L. Bouyer, “o homem representa, a mulher é”: ele representa, porque só o Pai que está no céu é a Vida e a fonte da vida, enquanto a mulher é em si mesma, a acolhida desta vida. Neste sentido, a mulher é sempre titular de seus relacionamentos, enquanto o homem é muitas vezes chamado a ser ministerial, a representar um outro: a dor física da mulher no mistério do gerar e o relativo “distanciamento” físico do homem não são nesse sentido, coisas de pouca importância, mas são objeto de sentimentos específicos e de cuidados educativos, geralmente completamente ausentes nos caminhos de formação! E, no entanto, estas são coisas simples, escritas e explicadas por Deus em nossa própria carne, e não apenas na evidência da forma receptiva do corpo feminino e da forma ativa do corpo masculino, mas também na maior propensão da mulher no relacionamento e do homem à ação, na inclinação conectiva presente no cérebro dela e na inclinação distintiva presente no cérebro dele. Graças a estas maravilhosas características de gênero, o homem e a mulher podem amadurecer juntos: a mulher sensibiliza a alma do homem e o homem estabiliza a alma da mulher, porque caso contrário, como muitas vezes se vê, a mulher permanecerá vítima da sua complexidade e riqueza interior, e o homem permanecerá perdido nas coisas e pouco atento às pessoas. É por isso que o Papa diz que o trabalho artesanal da família é, em primeiro lugar: “Talvez a maior missão de um homem e de uma mulher no amor seja esta: a de se tornarem, um ao outro, mais homem e mais mulher. Fazer crescer é ajudar o outro a moldar-se na sua própria identidade” (AL 221).


Roberto Carelli SDB

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